quinta-feira, 7 de novembro de 2013

O paradoxo do tempo

  • Na superfície, o momento presente é "o que acontece". Uma vez que os eventos mudam sem parar, parece que cada dia da nossa vida é formado por milhares de momentos em que coisas diferentes ocorrem. O tempo é considerado uma sucessão interminável de momentos - alguns "bons", outros "maus". Ainda assim, se observarmos mais de perto, isto é, por meio da nossa sensação pessoal imediata, veremos que, na verdade, não há muitos momentos, mas somente este momento. A vida é sempre o Agora. Toda a nossa vida se desenrola nesse constante Agora. Até mesmo os momentos do passado e do futuro só existem quando nos lembramos deles ou os antecipamos. E fazemos isso pensando sobre eles no único momento que existe: este.

  •  Então, por que parece que há muitos momentos? Porque o momento presente se confunde com o que acontece, com o conteúdo. O espaço do Agora se embaralha com o que ocorre nesse espaço. A mistura do momento presente com o conteúdo faz surgir não só a ilusão do tempo como a ilusão do ego.

  •  Existe um paradoxo nesse caso. Por um lado, como podemos negar a realidade do tempo? Precisamos dele para ir de um lugar a outro, preparar uma refeição, comprar uma casa, ler um livro. Necessitamos dele para crescer, para aprender novas coisas. Qualquer coisa que façamos parece tomar tempo. Tudo está sujeito a ele e, no fim das contas, "esse maldito tempo tirano", como diria Shakespeare, acabará nos matando. Poderíamos compará-lo a um rio revolto que nos carrega em suas águas ou a um fogo incontrolável que a tudo consome.

  •  Certa vez, encontrei-me com velhos amigos, uma família com a qual eu perdera o contato havia muito tempo, e fiquei chocado quando os vi. Quase perguntei: "Vocês estão doentes? O que aconteceu? Quem fez isso com vocês?" A mãe, que andava apoiada numa bengala, parecia ter encolhido, o rosto todo enrugado. A filha, que cheguei a ver cheia de energia e entusiasmo, animada pelas expectativas da juventude, agora parecia cansada, esgotada, depois de criar três filhos. Então me lembrei: quase 30 anos tinham se passado desde nosso último encontro. O tempo havia feito aquilo com eles. E tenho certeza de que meus amigos ficaram igualmente chocados quando me viram. 

  • Tudo parece estar sujeito ao tempo, ainda assim tudo acontece no Agora. Esse é o paradoxo. Sempre vemos um grande número de evidências circunstanciais para a realidade do tempo, como uma maçã murcha, nosso rosto no espelho comparado à nossa aparência numa fotografia tirada 30 anos antes - porém, nunca encontramos uma evidência direta, jamais vivenciamos o tempo em si. A experiência que temos invariavelmente é a do momento presente, ou melhor, do que ocorre nele. Se nos basearmos apenas nas evidências diretas, então o tempo não existe, e o Agora é tudo o que existe, sempre.

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