quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Eliminando o tempo

  • Não podemos transformar nossa libertação do ego numa meta futura e depois tentar alcançá-la. Tudo o que obtemos com isso é uma insatisfação maior, mais conflito interior, porque sempre vai parecer que ainda não conseguimos chegar lá, que ainda não "atingimos" esse estado. Quando estabelecemos a liberdade do ego como nosso propósito futuro, nós nos damos mais tempo, e mais tempo corresponde a mais ego. Devemos observar com cuidado para ver se nossa busca espiritual é uma forma disfarçada de ego. Até mesmo a tentativa de nos livrarmos do "eu" pode ser uma procura mascarada por mais tempo se essa libertação for transformada num objetivo futuro. Dar mais tempo a nós mesmos é exatamente isto: conceder mais tempo ao "eu". O tempo, ou seja, o passado e o futuro, é aquilo de que o falso eu fabricado pela mente, o ego, vive. E o tempo está na nossa mente. Ele não é algo que tenha uma existência objetiva "ali fora". É uma estrutura mental necessária para a percepção sensorial, indispensável pelos propósitos práticos, mas também é o maior obstáculo ao autoconhecimento. O tempo é a dimensão horizontal da vida, a camada superficial da realidade. E há ainda a dimensão vertical da profundidade, à qual só temos acesso através do portal do momento presente. 

  •  Assim, em vez de nos concedermos tempo, devemos removê-lo. Retirar o tempo da nossa consciência é eliminar o ego. É a única prática espiritual verdadeira.

  •  Quando falo da eliminação do tempo, não estou, é claro, me referindo ao tempo do relógio, que é usado com propósitos práticos, como marcar um encontro ou planejar uma viagem. Seria quase impossível atuar neste mundo sem esse tempo convencional. O que estou propondo é a eliminação do tempo psicológico, que é a preocupação interminável da mente egóica com o passado e com o futuro e sua resistência a entrar num estado de unicidade com a vida e viver alinhada com a inevitável condição do momento presente de ser o que é. 

  •  Sempre que um não habitual à vida se transforma num sim, toda vez que permitimos que esse momento seja como ele é, dissolvemos tanto o tempo quanto o ego. Para que o ego sobreviva, ele deve tornar o tempo - o passado e o futuro - mais importante do que o momento presente. Para o ego, é impossível ser amistoso com o Agora, a não ser por um breve instante logo após obter o que deseja. Contudo, nada consegue satisfazê-lo por muito tempo. Assim que ele se converte na nossa vida, existem duas maneiras de sermos infelizes. Não alcançarmos o que desejamos é uma. Alcançarmos o que desejamos é a outra. 

  •  O Agora assume a forma de qualquer coisa ou acontecimento. Enquanto resistimos a isso internamente, a forma, isto é, o mundo, é uma barreira impenetrável que nos separa de quem somos além da forma, que nos afasta da Vida única sem forma que nós somos. Quando dizemos um sim interior para a forma que o Agora adquire, ela própria se torna uma passagem para o que não tem forma. A separação entre o mundo e Deus se dissolve.

  •  Quando reagimos à forma que a Vida assume no momento presente, tratando o Agora como um meio, um obstáculo ou um inimigo, fortalecemos nossa própria identidade formal, o ego. Disso resulta a atitude reativa do ego. Ele se vicia em reagir. Quanto maior nossa disposição para manifestar uma reação, mais vinculados nos tornamos à forma. Quanto maior a identificação com ela, mais forte é o ego. Nosso Ser então deixa de brilhar através da forma - ou só faz isso vagamente. 

  •  Por meio da não-resistência à forma, aquilo em nós que se encontra além da forma emerge como uma presença de total abrangência, um poder silencioso muito maior do que a identidade de curta duração que temos na forma - a pessoa. Ele é mais profundamente quem nós somos do que qualquer outra coisa no mundo da forma.

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